sexta-feira, 11 de abril de 2008

Barraco francês

Nunca fui fã dos programas de barraco que vão ao ar na tv brasileira mas aqui na França eles servem para me ensinar francês tanto que consigo acompanhar parcialmente os diálogos e comentários.

Sempre me espantei como pessoas tímidas vão aos programas de tv para se declararem a um amor platônico e receberem um fora em rede nacional. É divertido ver a lavagem de roupa suja que ocorre ao vivo entre casais e famílias. Um dos programas mostrou uma dona de casa de cerca de 40 anos com 3 filhos adolescentes que vivia uma paixão com o namorado de 20 anos. Ela passou a agir como adolecente tardia e os filhos passaram a cuidar de si mesmos, da casa e da mãe que passava o tempo todo de beijos e abraços no sofá com seu garotão. Claro que o programa mostrou a mãe-tornada-adolescente caindo em si e voltando à razão. Para mim muitos desses casos são tão verdadeiros quanto uma nota de 3 reais ou de 3 euros.

Ontem à noite duas mulheres choravam em rede nacional o dinheiro que perderam para dois vigaristas. Uma foi enganada por um radiestesista que além de usar o pêndulo para resolver problemas pessoais se apresentava como conselheiro financeiro, legal e ainda de quebra receitava remédios. Os conselhos e negócios propostos por ele custaram à senhora, ex-dona de uma pequena construtora, 80 mil euros. A outra senhora foi enganada por um pastor africano de fala francesa que prega em inglês para quem entregou 145 mil euros para financiar uma cooperativa de cacau e café em algum lugar da África. O programa filmou as tentativas das senhoras de recuperarem seu dinheiro enquanto os vigaristas negavam na maior cara-de-pau que tivessem enganado alguém, tipo os ladrões do dinheiro público brasileiro em declaração às redes de tv. E mostrou o radiestesista dando uma consulta para uma jornalista fingindo ter um problema amoroso e o pastor no púlpito curando e exorcizando os presentes, tudo filmado com as mini câmeras dedo-duro e com direito a palavrões e quase porradas. Como esperado, nada resolvido, e então as vítimas foram para um banquinho no meio do palco do programa de TV, onde advogados e outros profissionais contratados pelo programa tentavam convencer o escroque a se arrepender ao vivo e a prometer reparar o mal causado. O programa esticou ao máximo o suspense da reparação do erro, com os dialógos entre os profissionais do programa e o charlatão transmitidos em alto e bom som mais as músicas incidentais que aumentavam o clima de suspense. Alguns dos diálogos e situações entre os jornalistas e os espertos eram tão improváveis que poderíamos dar um troféu-asno ou canastrão para os charlatães que atuaram com tanta naturalidade quanto os artistas pornô que gemem e se contorcem nos vídeos especializados. Os advogados do programa tentavam convencer os acusados com ameaças de denúncias por exercício ilegal da medicina e da advocacia, de remessa ilegal de dinheiro, etc. Gritavam, exasperavam-se, mostravam uma indignação e uma sinceridade tão comovente que quase fui convencido a acreditar que iria presenciar um milagre de conversão de um pilantra no mais sincero bom samaritano.

O barrado daqui conta com mais grana para a viagem do jornalista-detetive à África atrás da cooperativa de cacau e café. Mas no final das contas, não há diferença entre o barraco e o “barracô”. Roupa suja e maladragem são iguais em qualquer lugar do mundo.

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